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Iranian trip...

  • Foto do escritor: asduarte79
    asduarte79
  • 16 de mai. de 2015
  • 9 min de leitura

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Seriam precisas muitas páginas para descrever tudo o que vivi durante os 12 dias que estive no Irão. Na verdade comecei por escrever um diário de viagem, mas acabei por desistir e deixar essa tarefa pendente. Afinal havia tanto para viver e experienciar...

Tudo começou com uma ideia. Um grupo de amigos de diferentes países, que o destino juntou em Enschede. A questão colocou-se: porque não ir ao Irão? Afinal tinhamos a desculpa perfeita... uma anfitriã (de Tabriz), a vontade imensa de conhecer e viajar e o desejo de aproveitar aquela que seria uma das poucas oportunidades de conhecer um país que ainda tantas controvérsias levanta.

São muitas as ideias, os preconceitos e estereótipos. É um país de terroristas; as mulheres andam todas de burca; as turistas podem ser trocadas por camelos; são todos árabes; o país está em guerra e não é seguro; os estrangeiros são mal recebidos; a comida é “esquisita”; o país é composto por um conjunto de ruínas resultantes da guerra, por entre as quais as crianças correm descalças com armas na mão; a falta de higiéne é uma constante... Enfim, um bem haja à nossa comunicação social e à nossa falta de informação.

Também eu mostrei ao início reticências, confesso. Não é fácil aceitarmos o que não conhecemos sem fazermos juízos de valor. É difícil não recear nem que por um segundo ir a um país onde o simples facto de ser mulher é limitativo em aspectos tão simples como o vestuário ou a forma de agir. Eu diria que a ignorância é aliada da nossa fértil imaginação. Assim, comecei por consultar sites na net e blogues com posts escritos por pessoas que tinham visitado o país; informei-me sobre a história e a cultura do mesmo e, sobretudo, sobrecarreguei a pobre Parya (a nossa anfitriã) com mil perguntas. E não foi preciso muito para o “bichinho” da viagem e da aventura começar a crescer dentro de mim.

O primeiro passo era conseguir o visto. Confesso que foi bastante simples e longe de burocracias. Dirigimo-nos a Haia, à Embaixada do Irão e entregámos todos os documentos necessários. O visto chegou pelo correio passado uma semana. Depois, aproveitamos uma promoção e comprámos os bilhetes. Partindo de Amesterdão em direcção a Teerão, a viagem ficou pouco mais cara do que uma viagem para Portugal. O primeiro passo estava dado. Entrámos em contagem decrescente.

Partimos no dia 2 de Maio. O programa incluiu diferentes cidades – Teerão e Tabriz, onde tínhamos alojamento e Isfahan e Shiraz, onde conseguimos pacotes turísticos por preços simpáticos (incluindo viagens, guia turístico e hotel com pequeno-almoço).

Este texto não pretende descrever a viagem e os locais exaustivamente, mas apenas satisfazer algumas curiosidades e expressar parte daquilo que esta viagem me trouxe. Claro que tudo o que escrevo é fruto daquela que foi a minha experiência e muito através da experiência e do círculo de amigos e familiares da nossa anfitriã.

Comecemos pelas pessoas...

Os iranianos são regra geral pessoas hospitaleiras. A família e o seu círculo de amigos tem um enorme peso nas suas vidas e, quando conhecem alguém são simpáticos, cordiais e acolhedores. Gostam de receber e procuram dar tudo o que de melhor têm na sua casa. Rapidamente nos convidam para sentar e enchem a mesa de fantásticas iguarias. Quando entramos numa loja, é comum oferecerem chá e biscoitos. Gostam também de mostrar o que de melhor tem o seu país e a sua cidade. Posso dizer que na nossa viagem tivemos a sorte de termos não apenas a Parya como anfitriã, mas também os seus pais, o tio, o amigo do tio, as primas, o grupo de amigos. Todas estas pessoas fizeram de tudo para nos sentirmos bem. Deram-me muito e a elas estou francamente agradecida. E, sem hesitações, digo que o fizeram com gosto e com imenso carinho. Disponibilizaram-nos transporte; acompanharam-nos; mostraram-nos os locais e sítios mais importantes e os restaurantes com a melhor comida; ajudaram-nos em tudo o que podiam e ainda mais.

O T’aarof

Ao referir as pessoas e a forma como se relacionam é impossível não referir o T’aarof. Resumidamente é todo um conjunto de regras sociais e etiqueta que define a forma como as pessoas se relacionam no seu dia-a-dia. O ser cordial. Por exemplo, alguém oferece algo e o outro diz que não; a primeira pessoa volta a oferecer e a segunda pessoa volta a dizer que não e assim sucessivamente. Aquilo que em Portugal muitas vezes fazemos com as pessoas menos próximas, no Irão aplica-se a todos, mesmo aos membros da família ou amigos. O convidar alguém a ir a sua casa, mesmo quando por vezes não é a melhor altura; o insistir em pagar algo; o oferecer uma coisa que a outra pessoa gostou; o encontrar a melhor forma de levar a outra pessoa a fazer o que gostaríamos que fizesse dizendo as palavras certas... Tudo rodeado de muita cordialidade. Não quero dizer com isto que as pessoas fingem quando são simpáticas ou nos oferecem algo, não. Apenas é esta a forma de estar e agir e todos sabem que assim é.

Os turistas

Ainda sobre as pessoas, um apontamento sobre a forma como os turistas são vistos neste país – um misto de curiosidade e de fascínio. Em nenhum momento senti que ser estrangeiro é sinónimo de perigo ou de xenofobia. Posso dizer que passámos por diferentes situações: algumas pessoas olhavam para nós com curiosidade, outras (muito menos) olhavam estupefactas. Contam-se pelos dedos as vezes em que nos olharam de forma fixa e perturbadora. Por outro lado, aconteceu-nos diversas vezes (nas diferentes cidades) virem falar-nos, perguntarem-nos de onde erámos, o que achávamos do país, quais os nossos nomes e pedirem-nos para tirarmos fotografias com eles. Estamos a falar de meninas (estudantes), mulheres e homens adultos. Também de salientar que entre os comerciantes, facilmente erámos associados a “estrangeiros com dinheiro”, talvez em parte devido à ideia pré-definida de que “turista que é turista tem dinheiro”. Enganaram-se...

Sobre a higiene...

Os iranianos são loucos em relação à higiene. Podemos encontrar publicidade sobre cuidados de higiene logo no aeroporto, por exemplo. Depois temos vários exemplos no dia-a-dia: os cuidados extremos com a limpeza e lavagem das mãos; as reticências em partilhar copos ou garrafas; a aversão a tudo o que seja sujo, que tenha tocado no chão ou que tenha tido o contacto com muita gente, etc... Nesta parte há que referir as casas de banho – com um buraco no chão ou com uma sanita, toda a casa de banho no Irão tem uma torneira de lado para a lavagem das partes intímas. E que se atreva alguém a sair da casa de banho sem a usar ou sem lavar as mãos.

As mulheres no Irão...

Muito se fala sobre a condição da mulher no Irão. É certo que muito ainda é preciso mudar, mas penso que lentamente essas mudanças estão a ser implementadas. E isso vê-se em pequenos aspectos – as mulheres que ocupam cada vez mais lugares nas universidades e nos locais de trabalho; as roupas de cores vivas e a maquilhagem; a presença em todos os locais (de dia ou de noite); a forma descontrída como estão e se apresentam; a forma como fumam em locais públicos; os casais de mãos dadas na rua; etc. Claro que ainda existem limitações. Mas, só para esclarecimento, e ao contrário do que muito se diz: as iranianas não usam burca! As cabeças têm que estar cobertas sim, embora sem extremismos (o cabelo não precisa de estar coberto na totalidade) e algumas mulheres vestem-se cobrindo-se de negro (sobretudo nas zonas mais tradicionais). Situações vivenciadas e a apontar: nos hotéis homens e mulheres que não sejam casados dormem em quartos separados (alguns hotéis abrem uma excepção para estrangeiros); no metro podemos encontrar vagões mistos e outros só para mulheres; em alguns autocarros podemos encontrar mulheres na parte de trás e os homens na parte da frente. No autocarro que fazia a ligação entre Isfahan e Shiraz foi-nos pedido para mudar de lugar, por exemplo. Caso a polícia mandasse parar a viatura, poderia não ver com bons olhos o facto de duas mulheres irem sentadas num dos bancos da frente. São situações... muito já foi feito e muito ainda pode mudar, gradualmente acredito.

O dinheiro

O dinheiro foi um dos grandes “quebra-cabeças” da viagem. O câmbio dos euros para riais foi só o começo. Depois disso, e embora o rial seja a moeda oficial, os preços são apresentados em tomans, que na oralidade são apresentados “abreviados” retirando-se alguns zeros. Por exemplo: 1.000 000 RL (1 milhão de riais) são 100.000 tomans (o que se resume na oralidade a 100 tomans), o que é equivalente a 31 euros e pouco. Ora lidar com “milhões” é logo à partida estranho. “Temos connosco 4 milhões” soa a coisa de milionário. Depois vem o problema das notas... de cores semelhantes, com menos ou mais zeros. Uma nota de 10.000 RL (1000 tomans ou 1 toman) é o equivalente a cerca de 0,32 cêntimos. Ora, facilmente se enchia a carteira com um conjunto farto de notas. Posso dizer que até ao último dia, ouvimos a Parya dizer frases do género: “apanham o táxi e pagam cerca de X tomans. São duas notas verdes e uma das azuis”. Os turistas totós agradeciam!

O tráfego

O que dizer? O tráfego é de loucos!!! Em todas as cidades, mas sobretudo em Teerão (dado o seu tamanho e população) as pessoas conduzem como loucas, atravessam-se no meio dos cruzamentos, entre carros, motas e carrinhas. As buzinas são música ambiente e andar de táxi é sinónimo de adrenalina. É fácil ver alguém a fazer marcha atrás numa via rápida; uma mota com uma família ou 3 pessoas ao mesmo tempo; carrinhas com mercadorias que se equilibram de forma mágica; ultrapassagens suicídas... Posso dizer que perto dos iranianos, os italianos são uns meninos!

Um pequeno parágrafo sobre os taxistas. Durante a nossa estadia, o táxi foi o nosso principal meio de transporte. Os preços são muito acessíveis e o táxi acaba por ser a forma mais rápida de chegar onde desejamos. Embora perguntassemos sempre qual o valor aproximado da deslocação, foi comum o “ajuste de contas” final – ou porque as malas deviam ser cobradas; ou porque o taximetro não estava ligado e o valor era mais elevado do que o inicialmente acordado. Fantástico foi ver a Parya a reclamar com os taxistas à boa maneira iraniana.

A História

Para quem gosta de História, de Arqueologia, de Cultura...o Irão é sem dúvida um país a visitar. Falar dos sítios e monumentos que vimos, seria preencher páginas e páginas. Posso dizer que as mesquitas e os palácios são totalmente impressionantes, com uma decoração e técnicas totalmente diferentes de tudo o que tinha visto até então. Visitar as necrópoles dos antigos reis persas e Persepólis - antiga capital do Império Aqueménida, foi também algo que nunca imaginei poder fazer. Não tenho palavras para descrever o que senti perante tamanha imensidão e grandiosidade. Impressionante. Também Kandovan (a Capadócia do Irão) me encantou, com as suas casas escavadas na pedra e a simplicidade e hospitalidade das suas gentes. Todas os locais visitados se mostraram cheios de vida e histórias, desde as grandiosas mesquitas e palácios, às simples casas familiares e jardins. Cada cidade me encantou à sua maneira. Teerão pela sua grandiosidade; Tabriz pela ligação às suas gentes e suas histórias; Isfahan pela vida sentida nas ruas, os seus monumentos e pontes sobre o rio; Shiraz pela simpatia das pessoas, pelo cheiro a flores e a poesia relembrada e vivida até hoje por todos.

No que se refere à poesia, uma pequena referência a Khwāja Šamsu d-Dīn Muḥammad Hāfez-e Šīrāzī, conhecido pelo seu pseudónimo Hāfez ou Hafiz. Um dos grandes poetas iranianos, nascido em Shiraz no século XIV. Os seus poemas são ainda hoje lidos e o seu nome é ainda hoje recordado. Ao lado do Corão, o seu livro está presente na casa dos iranianos e são muitas as tradições que se mantêm. No ano novo o seu livro é aberto aleatoriamente por cada pessoa e um poema é lido, ditando a sorte. Na rua, um rapaz ofereceu-nos os seus versos, em troca de poucos tomans. As suas palavras são lidas e os dados são lançados, de acordo com a crença de cada um. O seu túmulo (que visitámos à noite) está rodeado de um ambiente místico e os crentes ajoelham-se e tocam a pedra que o cobre, enquanto debitam os versos do poeta.

Diferenças sociais

As diferenças sociais são notáveis em qualquer cultura e o Irão não é excepção. Os pobres, os muito pobres, os ricos, os muito ricos. É fácil em cidades como Teerão notarmos essas diferenças em pequenas coisas: nas roupas, no olhar, nas casas, nos carros. Muitas das coisas chegam até nós sob o olhar e as vivências da nossa anfitriã, mas nada me faz duvidar que as diferenças existem e que são “instituidas” e penso que até aceites pelos iranianos. Por outro lado, uma parte da sociedade é “olhada” de forma diferente, como é o caso por exemplo dos árabes (antigos “rivais”) e os afegãos (associados a profissões manuais e mal remuneradas).

A comida

Por fim, e não menos importante, a comida. Não que as expectativas fossem baixas, pois já tinhamos experimentado umas quantas iguarias em casa da Parya na Holanda, mas foram de certo superadas durante a viagem. Perdi a conta a todos os pratos fantásticos que experimentámos. Refiro aqui que um restaurante melhor não é sinónimo de contas astronómicas, e sem dúvida compensa comparativamente à comida de rua. Por exemplo, uma refeição num bom restaurante pode significar pagar cerca de 10 a 13 euros no máximo por pessoa. Aqui vai uma singela lista de algumas das iguarias a não perder numa visita ao Irão: o pão; o queijo; o arroz iraniano (a acompanhar com a batata tostadinha por cima); todos os produtos feitos com romã (sumo, gelado, gelatina, pastilhas, etc.); os gelados; o kebab (de todos os tipos, mas destaco o de borrego); o dizi ; o ash; os estufados; as sobremesas (de destacar os mais desejados da viagem – baklavas).

Para quem teve a paciência de ler este post até ao final, volto a referir, que é de todo impossível descrever tudo o que esta viagem me pemitiu sentir e viver. Mas foi sem dúvida uma viagem inesquecível e um país onde desejo voltar, porque de certo muito ficou por conhecer e explorar. Por enquanto, deixo apenas um breve testemunho dos meus 12 dias por terras persas.



 
 
 

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